QUADRAS AO DEUS DARÁ
Por Joaquim A. Rocha
Apresentação
Confesso que quem me inspirou a fazer
quadras foi António Aleixo, o grande poeta algarvio. Certa altura, na feira do
livro, comprei «Este Livro Que Vos Deixo», da sua autoria. Fiquei entusiasmado.
Quem havia de dizer que aquele homem simples, apenas com a terceira classe da
instrução primária, era capaz de escrever versos tão profundos e de uma beleza
inigualável. Comecei também eu a escrever umas quadras, a tentar imitá-lo. Umas
melhores, outras menos conseguidas, outras medíocres, elas aí estão, à espera
que alguém as leia. Não espero que me digam que gostaram. É confrangedor para mim ouvir
palavras favoráveis daquela pessoa que lê aquilo que eu vou escrevendo e publicando. Se gosta, cala; se detesta, reclama. E tem razão, se gasta o seu dinheiro na aquisição do livro. Caso contrário, o melhor é
atirar com tudo para o lixo e esquecer. Eu, ao longo destes anos, também já li
muito texto insipiente. Génios na literatura há poucos. Tivemos Camões na
poesia, Eça e Camilo na prosa, Gil Vicente no teatro, etc., falando apenas de
escritores portugueses. O dom de escrever nasce praticamente no berço: depois é
só desenvolvê-lo. Se não se tiver jeito para esta ou aquela arte na infância,
dificilmente o terá algum dia. A obra aparece praticando, experimentando. Se
nunca se experimentar, jamais se conhecerão os nossos talentos. O estudo, o
conhecimento do que foi feito até então, é fundamental para desenvolvermos as
nossas capacidades criativas. Se pudermos publicar aquilo que vamos paulatinamente construindo, devemos fazê-lo; porque a crítica, sendo honesta e científica, ajuda
imenso o criador.
Reconheço
que este tipo de poesia se pode considerar de categoria inferior, se comparada
com o soneto, a sextilha, o poema heroico, etc.; no entanto, essa comparação
não deve ser feita de leve ânimo, porque a quadra está conotada de uma maneira
geral com poetas analfabetos ou pouco instruídos; gente do campo, da fábrica, sem
habilitações literárias para além da instrução básica; logo, não podem aspirar
à criação de poemas com grande fôlego, com grandes exigências técnicas e saber
universal. A quadra está intimamente ligada aos cantores de festas de aldeia,
onde se ouvem as populares cantigas ao desafio, nas quais ressaltam as
brejeirices que nos poemas considerados maiores não se admitiriam, embora haja
exceções, por exemplo o Bocage com os seus poemas eróticos e malcriados.
Há canções interessantes a partir de
quadras populares. Estou a lembrar-me do extraordinário Zeca Afonso e de
outros, que selecionaram algumas quadras e a partir delas fizeram a música,
transformando assim aquelas modestas quadras em baladas inesquecíveis.
Para mim escrever quadras, com versos de
sete sílabas, é como descansar de trabalhos mais exigentes. Aparecem tão
rapidamente que tenho de as registar logo a seguir, caso contrário corre-se o
risco de jamais verem a luz do sol.
Neste trabalho mal feito,
Que ora vos apresento,
O mal nele represento,
Pois o bem, esse é perfeito.
2
A quadra popular
Tem muito que se lhe diga.
Aquela dá que pensar,
Com outra faço cantiga.
3
Eu tenho quadras feitas
Ao gosto de toda a gente;
São brejeiras, imperfeitas,
Uma ri-se, outra mente.
4
Ó vate António Aleixo,
Quem me dera teu talento;
«Este livro que vos deixo»
Será sempre meu sustento.
// continua...
SER POETA É SER MAIS ALTO,
ResponderEliminarÉ SER MAIOR DE QUE OS HOMENS!